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Ser disléxico é viver na incerteza de que se vai ser bem-sucedido. É dizerem-nos toda a vida que somos diferentes e que precisamos de mais tempo para fazer as coisas do que as pessoas consideradas normais. É passar a vida a lidar com adversidades e saber ultrapassar dificuldades. Para nós, ler e escrever pode ser um autêntico terror, contudo, nada é impossível se tivermos ambição.

Quando fui diagnosticada tinha apenas seis anos. A professora começou a achar estranho o facto de não conseguir escrever o meu nome como os outros meninos. Escusado será dizer que aqui culpo obviamente os meus pais e não a professora. Se já é difícil aprender a escrever Silva, imaginem Dutschke.

Para me explicarem o que era esta nova componente que me iria caracterizar para o resto da vida, disseram-me que o meu cérebro possuía aspetos diferentes face ao dos outros meninos. Contudo, disseram-me também que a boa noticia é que o Einstein e o Tom Cruise também eram disléxicos e que chegaram muito longe nas suas carreiras, por isso, havia esperança. Na altura lembro-me de pensar que esta informação era irrelevante, porque as únicas características que tinha em comum com estes dois senhores eram um apelido estranho e difícil de escrever, e uma baixa estrutura que me impedia de chegar aos armários. Por isso, aqui penso que a esperança a que se referiam seria para tranquilizar os meus pais e não propriamente a mim com seis anos. É como quem diz, pode ser que tenham sorte e que ela não fique limitada para o resto da vida, já que é disléxica.

Contudo, e apesar de todas as diversidades, ser disléxico tem muitas vantagens. Certamente que uma delas não é a escrita nem a fala que por vezes nos atrapalha, mas sim a arte de nos sublimarem constantemente. Quando comecei o quinto ano, tinha ótimas notas a inglês e não estudava. Como a norma diz que um disléxico não é bom por natureza a línguas, era vista como um exemplo de aluna. Aqui começa a estupidez que ilustra a nossa realidade diária. Nós somos pessoas diferentes entre nós e a dislexia não vem com um manual de instruções como se um movel do Ikea se tratasse. Somos mais complexos e existem vários graus de dislexia. No meu caso é a omissão de palavras. O meu cérebro processa mais rápido o que quero escrever e por vezes as frases parecem não fazer sentido aos que as leem a seguir.

Contra todas as probabilidades, licencie-me em Relações Públicas. Algo que sempre me foi dito que seria impossível por ser uma área sine qua non à escrita. Não contente com apenas uma licenciatura, ainda decidi tirar mestrado em Comunicação Política. Foi difícil? Claro que foi, especialmente quando num trabalho escrevi mal o nome de um autor e quase fui chumbada por isso. O que não deixa de ser satírico porque o professor escreveu mal o meu nome desde o início do semestre e não era disléxico.

Por entre peripécias e adversidades, ironicamente o meu trabalho atual é escrever. Escrevo artigos de Relações Publicas para pessoas, empresas e serviços sobre os temas mais ecléticos que possam pensar. Gosto do que faço e não foi a dislexia que me travou de conseguir o que sempre quis, muitas vezes sem saber que o queria. Não foi a professora de matemática, inglês ou português que decidiu o meu futuro. Não foram as notas dos testes que me impediram de chegar até aqui. Não me tronei num Einstein nem num Tom Cruise. Tornei-me na Francisca que toda a vida vai confundir a esquerda e a direita, que vai soletrar para dentro o seu apelido sempre que o escreve, e que vai querer sempre desafiar as probabilidades. Confirmo que a dislexia é para a vida e que é um desafio, mas também – e volto a frisar – estou segura de que tem as suas vantagens. Não há press releases mais revistos que os meus e viver da escrita obriga-me a melhorar continuamente o meu trabalho. Veem?

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